sexta-feira, 12 de novembro de 2010

A Rainha Escarlate



A noite poderia ter começado fria, mas ela jamais sentiria, nem seus pelos eriçariam, não mais. O pior, que nem mesmo lembrança de quando foi a última vez que isso aconteceu estava em sua memória. O carro era veloz, mesmo para as ruas londrinas e o vento que soprava a trazia de volta aquelas memórias. Quando o carro finalmente chegou ao local indicado, o homem que abriu o seu carro, fazia todas as mesuras e dizia: Vossa Alteza Anne, chegamos.

Ela desceu calmamente e aquilo era um contraste único, aquela área de Londres era próximo dos muçulmanos, que infestavam Londres, mas era também um local de pobres, drogados e perdedores e, ali, até a sua não-vida resplandecia diante daquelas trevas inócuas. Com apenas um olhar o negro que a servia como chofer saiu e ficou “de guarda” esperando as novas ordens daquela mulher imensamente linda, aos seus olhos, magnânima.

Anne entrou, sem o menor esforço, naquilo que era uma lavanderia local. As paredes úmidas, as máquinas velhas e o reboco caindo combinavam com a luz tremeluzente de uma fiação ainda exposta. Ela não entendia, ele poderia ter qualquer coisa, mas insistiu tanto em esconder seu imenso poder por detrás de uma máscara tão imunda? Ela não conseguia aceitar isso. Talvez isso o tenha feito perdurar por tanto tempo, mas não a todo o tempo, que isso servisse de lição para ela mesma. Enquanto pensava essas coisas, as suas pernas já a tinham levado para a escada secreta, escondida por detrás de uma placa velha de metal que fazia a vez de um quadro de força. Qualquer um com o mínimo de perícia notaria que não havia nenhum fio de eletricidade que chegasse até aquela suspeita placa de metal. Ela pensou que, apesar de sempre ter se protegido, só se protegeu contra os fracos mortais.

As escadarias desciam por uma escuridão úmida e sem ventilação, ela realmente estava entrando em um terreno escuro e jamais visitado. Um terreno feito para caça e só isso. Ela podia sentir o cheiro de sangue de anos que eram oferecidos a seu Mentor, mas agora eram tudo lembranças. Com o manejar de um dedo a tecnologia do interruptor trouxe a mágica da luz para aquele ambiente lúgubre. Uma enorme sala se descortinou a sua frente e, em contraste da lavanderia que ele construíra na fachada, aquele ambiente era ostentoso de ouro e prata, com imagens de bois nos cantos e uma pequena pira onde, obviamente, punha-se fogo em adoração a “divindade” Mitras. Mas não era o fogo importante, mas sim o sangue e era esse mesmo sangue que chegava agora ao recinto.

O negro estava ajoelhado, semi consciente, com uma fome sobre humana. Seus piores demônios, verdadeiros Shaitans, saiam a beira da sua consciência querendo mais. Havia tanto deles que ele queria um pouco de uma paz vermelha que ele não teria, a não ser que a diabólica londrina a sua frente assim o permitisse. Ele seria torturado e, se sobrevivesse, obviamente veria o Sol, ou as presas daquela beleza monstruosa clássica de Londres.

Anne caminhou lentamente e se apoiou em um dos grandalhões que exerciam tamanha força no corpo daquele Assamita e disse: “Você, realmente pensou que o seu crime seria esquecido? Perdoado? Aceito? Se você tivesse a mínima ideia do inferno que está longe e de que toda a culpa é sua.” A mão se segurou, ela não poderia perder a delicadeza, não na frente de um selvagem assassino.

“Então comecemos, quero informações e daqui não sairemos antes que você me dê tão preciosas informações”. Seus olhos vibravam de excitação, caçar era uma delícia e ela não negava, mas ela sentia mais excitação ainda na tortura, claro que ninguém saberia desse seu prazer sádico, mas pensar que poderia se justificar a qualquer conselho de anciões como “Evitando uma invasão Assamita” lhe dava carta branca até para o delicioso Amarante. Esse nome levava a sua língua em direção aos finos e potentes caninos protuberantes.

Na madrugada do dia seguinte, duas horas antes do amanhecer, Anne, ou a Rainha Anne dos Ventrue, saia de uma velha lavanderia nos subúrbios londrinos. O seu chofer, que havia esperado todo esse tempo como um típico soldado londrino da guarda real, só agora se movia, abrindo a porta do mesmo. Anne entregou a direção sussurrando bem baixo no ouvido do seu chofer, ele consentiu com a cabeça e entrou pela porta do motorista. Naquele momento, sem que ao menos percebesse, por um ato involuntário, ou reflexivo, Anne deixou cair o lenço que trazia a boca. O lenço rodopiou no ar e caiu na sarjeta, a água que passou por essa mesma sarjeta tingiu-se de um vermelho rubro, mas sem alma, sem potência. Ali, era só sangue e nada mais.

Owen Phillips

0 comentários: